quinta-feira, 25 de março de 2010

Ginástica e esportes

Houve muitas contribuições alemãs ao desenvolvimento do Brasil, nos mais variados campos.

Várias são menos aparentes, mas igualmente impactantes.

De modo geral, quando surgiam vilas havia uma ou mais igrejas, escola da comunidade, possivelmente alguma cooperativa, esforços para que houvesse algum tipo de assistência à saude (tendo surgido hospitais ainda hoje bem conceituados), e pelo menos um clube, geralmente com salão e uma "Kegelbahn" (cancha de bolão).

Sempre houve entre os imigrantes alemães e seus descendentes, como característica, espirito associativista.

Influentes foram os "Turnervereine" (sociedades de ginástica/atletismo), "Schützenvereine" (caça e tiro), bem como o canto e a música.

Aqui no Brasil, como entre os alemães nos Estados Unidos.

Falando em clubes, fazendo alguma busca na internet podemos nos surpreender. Temos os exemplos, entre outros, os da Sogipa em Porto Alegre, e em Curitiba sociedades como Concórdia, Rio Branco, Duque de Caxias, Thalia, Graciosa Country.

No Rio Grande do Sul foi especialmente relevante a contribuição alemã ao desenvolvimento do atletismo.Oportuno ler um trabalho de Gilmar Mascarenhas de Jesus, neste link.

Um pouco do que consta:"[...]Ao mesmo modo, a Federação Gaúcha de Remo, criada em 1894, foi a primeira entidade estadual de remo no Brasil (Melo, 1999:108). Em 1898, registra-se a realização do "primeiro campeonato estadual de remo". Neste certame, todas as equipes são oriundas da colônia alemã, sendo consequentemente o alemão a língua oficial das atas (Hofmeister, 1978). " e já como uma referência,"Foi por uma nota redigida em alemão que os moradores de Rio Grande, pelo menos os da colônia germânica, souberam da existência daquele esporte novo, em que 22 homens tentavam chutar uma bola de couro. Assinado pelo alemão Johannes Minnemann, o convite anunciava que haveria um jogo de futebol às 9h30min do dia 14 de julho de 1900, no campo do Clube de Tiro Alemão. Havia ainda um aviso: após a partida seria discutida a criação de um clube em Rio Grande (10)".

E, estas conclusões: Em síntese, a contribuição alemã à formação de uma base esportiva e ao advento do futebol no RS se ampara nos seguintes elementos:

1) dispondo de elevados recursos materiais, os alemães se organizam em associações (inclusive clubes e ligas) que reforçam sua identidade no lugar e alimentam o desejado espírito patriótico;

2) naquele contexto, os alemães são praticantes de esportes em grande escala, atitude inovadora ao contrastar-se com o sedentarismo da herança cultural lusitana e calcado no preconceito ao esforço muscular de nossa sociedade escravista;

3) enquanto numerosa e proeminente, a comunidade germânica no RS afeta a dinâmica social e está em condições de liderar processos de difusão de inovações;

4) ao exibir força, coragem e seu poderio nas competições esportivas, os alemães legitimam sua supremacia econômica, ao mesmo tempo que se qualificam como arautos da modernidade;

5) no final do século XIX os alemães edificaram uma ampla base esportiva, sobretudo nas cidades de Rio Grande e Porto Alegre, facilitando a adoção posterior do futebol. Estiveram diretamente envolvidos na fundação dos primeiros clubes de futebol nas duas cidades supracitadas.

Do mesmo autor, sobre a "via platina" de introdução do futebol no Rio Grande do Sul, num periodo em que havia predominio de alemães e ingleses no comércio e indústria na cidades do sul.

Uma curiosidade sobre o porque do uso de gorro nos uniformes de futebol, para proteger a cabeça em cabeceios pode ser vista aqui.

Outro eixo na época era constituido por Rio e São Paulo, e estes meus breves comentários não esgotam o assunto.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Dialetos alemães

Muitos descendentes de alemães, seja no Brasil, ou nos Estados Unidos, falam algum tipo de dialeto alemão, geralmente adaptado.

"A emoção está no dialeto", que para muitos é a lingua materna.

Meu pai (apesar de ter estudado e ensinado alemão), adotava muitas expressões hunsrickish no cotidiano, pelas influências que teve na infância. Era muito engraçado quando ele comia "Grumbeere" toda vez que minha mãe cozinhava "Kartoffeln".

Entre descendentes de alemães no Brasil, são milhares que ainda utilizam o convencionalmente chamado "Riograndenser Hunsrick".Uma mistura de Saarländisch e Hunrickisch com português.
De forma análoga acontece com o Pensylvanisch Deitsch, nos Estados Unidos, por exemplo, onde a mistura é com o inglês.

Para entender melhor o contexto, e que o Hunsrickisch continua vivo, é preciso lembrar alguma coisa das classificações usuais. Devemos partir dum vasto grupo de Rheinfränkisch, deste para Pfälzsich, dentro deste o Westpfälzsich, no qual por sua vez há 9 subdivisões, entre os quais estão o Saarländisch e o Hunsrickisch.

Então, duma visão mais ampla, podemos nos referir ao dialeto Pfälzsich (do Palatinado).

Dependendo dos conhecimentos que tivermos dos idiomas que foram misturados, ficam compreensiveis as variantes dialetais. Por exemplo, em virtude de eu conhecer (embora não pratique) o Riograndenser Hunsrick, e também ter suficientes noções de inglês, consigo entender bastante do Pensilvania German e algumas formas do Texas German (em acelarada extinção).

Interessante ouvir ( da DW, para quem tem noções de alemão e do Hunrickish):
Audio Pfälzisch Ler, Weltweit - artigos. Para os que falam Hunrickisch: Saarländisch,e também
este. E um desafio, entender esta mistura com inglês.

Note-se que as palavras adotadas do inglês (assim como do português), geralmente ou porque são mais curtas e fáceis ou porque dizem respeito ao que não existia a uns, digamos, duzentos anos, como o avião.

Aliás, temos para avião, o alemão Flugzeug (coisa para voar), no dialeto Luftschiff (navio aéreo, ao algo assim, o que soa como aeronave). E se não me engano, vi escrito para o Riograndenser Hunsrickisch, "aviong".

De modo geral, dialetos são apenas falados, daí a dificuldade de uniformizar alguma grafia para este linguajar teuto-brasileiro.

Conforme o que se lê na Deutsche Welle, os dialetos tem sido preservados mais no sul da Alemanha, do que no norte.

Meu sobrenome é Heberle. Por isto, me chamou atenção o caso do Alemmanisch.A maioria dos que usam este sobrenome vivem na região, embora nosso antepassado tenha vindo do Saarland.O Alemmanish, ultrapassa fronteiras. Alem da Floresta Negra, é falado na Alsácia, do outro lado do rio Reno na França, na Suiça, no Lichtenstein, no norte da Itália.

Outrossim, continua firme o Schwabisch. Tambem com alemães que utilizam este dialeto tive contato direto. Uma irmã de meu pai casou com um alemão suábio, padeiro. E um dos amigos dele e de meu pai, mais tarde mudou para Entre Rios, perto de Guarapuava, PR onde se instalaram Donauschaben em torno de 1950 (e lá a cooperativa deles opera a maior maltaria da América Latina).

Dificilmente alguem perde o sotaque, que assim muitas vezes ajuda a sabermos de onde veio nosso eventual interlocultor.

Curioso e intrigante é o de como se adaptam e sobrevivem dialetos alemães, seja na América do Sul ou do Norte, entre descendentes de imigrantes.

Será que há vantagem em ter um dialeto como idioma materno?

Boa resposta encontra-se no item 4, neste texto que elaborei.

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Alemães gauchos

Folclore e tradições alemãs, assim como italianas, polonesas e das demais etnias de imigrantes -no caso dos estados do Sul do Brasil e naqueles que recebem sulistas - tendem a ser substituídos pelo “gauchismo”. Chimarrão, churrasco, e CTG’s são cada vez mais comuns também entre descendentes de alemães.

O movimento gaucho também mudou de feição. Incorpora muito das tradições alemães, italianas, seja na música quanto na gastronomia.

Esta fusão formou uma nova identidade, que tende a ser prevalecente. Mais do que se identificar como descendente de alemães, a ênfase recai em ser gaucho.

Esta evolução do gauchismo é bem ilustrada por esta notícia, de 1998 (link). E a mesma veiculada em Niterói RJ (o que por si só já é significativo). Refere-se a CTG em Itapiranga, de colonização alemã, e menciona a “patroa” Noeli Heberle Bortoluzzi, sobrenomes alemão e italiano.

Parece contraditória a adesão de alemães ao Movimento de Tradições Gaúchas, se vinculado à causa farroupilha. Pois os líderes da colonização alemã eram contrários ao separatismo. Mas, é bem compreensível num contexto mais amplo, e pela própria evolução do MTG.

Numa reflexão rápida, consideremos o seguinte:

1 – O Rio Grande do Sul foi o último estado a integrar-se ao Brasil. Alemães tiveram contribuição decisiva na ocupação territorial, formação e defesa das fronteiras no sul do Brasil.

Sem as imigrações, a língua oficial no sul do país seria o espanhol.

Já antes da imigração (a partir de 1824, no RS), em 1774 o general Joachim Heinrich Böhm colocou em fuga os espanhóis, tornando o Rio Grande do Sul definitivamente brasileiro.Alemães tiveram importantes participações na Guerra Cisplatina (1825-1828); na guerra conta a Argentina (1851-1852), e na Guerra do Paraguai(1864/5-1870).

2 – Talvez os descendentes de alemães de hoje se considerem meramente descendentes “destes alemães imigrantes”, sem maiores vínculos com a Alemanha atual.Devemos lembrar que os imigrantes chegaram aqui antes da unificação alemã de 1871. A rigor, nem eram alemães no sentido de hoje.

Consideremos também, que por “jus solis” os descendentes são brasileiros, e que o “jus sanguinis” é desconsiderado para sua cidadania (não há como pleitear cidadania alemã, no geral). E, “estes alemães”, referindo-nos aos imigrantes que se radicaram no Rio Grande do Sul, se tornaram também gaúchos (gentílico), cujos descendentes se espalham pelo país.

Neste quadro, a meu ver, fica mais fácil compreender a identificação de descendentes de alemães com o gauchismo.

Atualizando (2013): Muito interessante o teor de palestra com dados esclarecedores com base em pesquisas do jornalista Sylvio Rockenbach em relação à participação de teuto-brasileiros no MTG (link).

Complemento, em reforço às considerações acima:

Em 22 de junho de 1767 Johann Heinrich Böhm foi nomeado pelo rei de Portugal, comandante de todas as tropas do Brasil, e incumbido da reforma prussiana do exército. Transformou os contingentes de tropas dispersos pelas diversas regiões do país em um exército coeso e homogênio. Daí o epiteto de "fundador do exército brasileiro"

Os espanhóis insistiam na defesa dos territórios que lhes caberiam pelo Tratado de Tordesilhas. Fazia mais de 13 anos que o Rio Grande do Sul estava ocupado pelo governador espanhol de Buenos Aires. Em 1774 o general Johann Heinrich Böhm conseguiu derrotá-los, consolidando as fronteiras do sul. O Rio Grande do Sul tornou-se definitivamente brasileiro. (Lembrando que a colonização alemã ali se iniciou só em 1824).

Por isto também é considerado "Libertador do Rio Grande do Sul"

Leia continuação sobre alemães gauchos.
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